29 janeiro 2007

hallelujah

suzanne takes you down to her place near the river
you can hear the boats go by
you can spend the night beside her
and you know that she's half crazy
but that's why you want to be there
and she feeds you tea and oranges
that come all the way from china
and just when you mean to tell her
that you have no love to give her
then she gets you on her wavelength
and she lets the river answer
that you've always been her lover
and you want to travel with her
and you want to travel blind
and you know that she will trust you
for you've touched her perfect body with your mind.
and jesus was a sailor
when he walked upon the water
and he spent a long time watching
from his lonely wooden tower
and when he knew for certain
only drowning men could see him
he said "all men will be sailors then
until the sea shall free them"
but he himself was broken
long before the sky would open
forsaken, almost human
he sank beneath your wisdom like a stone
and you want to travel with him
and you want to travel blind
and you think maybe you'll trust him
for he's touched your perfect body with his mind.
now suzanne takes your hand
and she leads you to the river
she is wearing rags and feathers
from salvation army counters
and the sun pours down like honey
on our lady of the harbour
and she shows you where to look
among the garbage and the flowers
there are heroes in the seaweed
there are children in the morning
they are leaning out for love
and they will lean that way forever
while suzanne holds the mirror
and you want to travel with her
and you want to travel blind
and you know that you can trust her
for she's touched your perfect body with her mind.

leonard cohen

exactamente, disse eu

there is always some madness in love.
but there is also always some reason in madness.

(he who has a strong enough 'why' can bear almost any 'how'.)

friedrich nietzsche

26 janeiro 2007

poema sobre a recusa (bom fim-de-semana)

como é possível perder-te
sem nunca te ter achado
nem na polpa dos meus dedos
se ter formado o afago
sem termos sido a cidade
nem termos rasgado pedras
sem descobrirmos a cor
nem o interior da erva.

como é possível perder-te
sem nunca te ter achado
minha raiva de ternura
meu ódio de conhecer-te
minha alegria profunda.

maria teresa horta

do amor

(para fiama, com as suas próprias palavras)

esta vista de mar, solitariamente,
dói-me. apenas dois mares,
dois sóis, duas luas
me dariam riso e bálsamo.
a arte da natureza pede
o amor em dois olhares.

fiama hasse pais brandão

uma chama não chama a mesma chama

uma chama não chama a mesma chama
há uma outra chama que se chama
em cada chama que chama pela chama
que a chama no chamar se incendeia

um nome não nome o mesmo nome
um outro nome nome que nomeia
em cada nome o meio pelo nome
que o nome no nome se incendeia

uma chama um nome a mesma chama
há um outro nome que se chama
em cada nome o chama pelo nome
que a chama no nome se incendeia

um nome uma chama o mesmo nome
há uma outra chama que nomeia
em cada chama o nome que se chama
o nome que na chama se incendeia

e.m. de mello e castro

desaparecido

sempre que leio nos jornais:
'de casa de seus pais desapar'ceu...'
embora sejam outros os sinais,
suponho sempre que sou eu.

eu, verdadeiramente jovem,
que por caminhos meus e naturais,
do meu veleiro, que ora os outros movem,
pudesse ser o próprio arrais.

eu, que tentasse errado norte;
vencido, embora, por contrário vento,
mas desprezasse, consciente e forte,
o porto de arrependimento.

eu, que pudesse, enfim, ser meu
- livre o instinto, em vez de coagido.
'de casa de seus pais desapar'ceu...'
eu, o feliz desapar'cido!

carlos queirós

24 janeiro 2007

corte de cabelo

fui cortar o cabelo, à hora de almoço. tive uma conversa muito psi com o cabeleireiro - mistura de programação neuro-linguística com 'self-esteem boosting therapies'; mistura de 'emotional intelligence' com 'superação de crises existenciais'.
incrível o que me acontece, aos tropeções.
informação a mais, semiótica a mais - 'overloaded', exactamente.
tenho medo da próxima vez que tiver que ir ao sapateiro.
(ou então tenho esperança.)

aforismo avulso

acordar luminoso, entardecer pardacento.
é tudo.

23 janeiro 2007

ladaínha para um retrovisor

'mal sabia eu
naquele dia
que era hoje
aquilo que eu queria'

citando francisca moreira
28.06.05
in http://franciscamoreira.blogspot.com

the kindness of strangers (to claire)

claire, inglesíssima esposa de um inglesíssimo colega meu, passou por aqui.
estive com a claire uma mão-cheia de vezes, não mais, a maior parte das vezes em jantares sociais (profissionais), ao longo dos últimos 3 anos.
e, no entanto..
e, no entanto, a claire acaba de me dizer coisas que me emocionaram - por serem tão necessárias 'in our times of need'. coisas que pressuporiam anos de convivência e uma certa intimidade; evidências que só quem é intrinsecamente independente nos pode dizer sobre nós próprios, de modo a que nós possamos acreditar no que é dito (e não na amizade com que é dito).
thank you very very very much.
again, touched by the kindness of strangers.

22 janeiro 2007

in memoriam: fiama

e morre-se assim, tão cheios de vida:


canto dos lugares

tantas vezes os lugares habitam no
homem
e os homens tantas vezes habitam
nos lugares que os habitam, que
podia
dizer-se que o cárcere de sócrates,
estando nele sócrates, não o era,
como diz séneca em epístola a
hélvia.

por isso cada lugar nos mostra
uma vida clara e desmedida,
enquanto o tempo oscila e nos
oculta
que é curto e ambíguo
porque nos dá a morte e a vida.

e os lugares somente acabam
porque é mortal cada homem
que houve em si algum lugar.

fiama hasse pais brandão

mensageiros da paz ?

arrasto o telemóvel comigo, como se de uma arca do tesouro se tratasse. moedas desbotadas, saquinhos com sal outrora salgado, souvenirs daqui e dali.
os símbolos - a armadura símbólica - protegem-nos, dão sentido. mas podem também servir de freio do que está 'para vir', quando se transformam muito mais em catedrais vivas, em honra de deuses do antigamente, do que em museus da memória pacificada.
num acto de elegância divina ou de absurdo becketiano, perdi todas as sms. anos e anos de memória ainda viva simplesmente varridos, levados noite dentro.
foi melhor assim.
a ironia ainda é arte maior - afinal 'eles' só queriam o meu bem.
e as primeiras impressões nem sempre são as que ficam.
mensageiros da paz que tarda, porque não ?

21 janeiro 2007

a canção

ontem como hoje; hoje como ontem

'a ânsia do consumo é uma ânsia de obediência a uma ordem não pronunciada. (..) todos sentem a ânsia, degradadante, de serem iguais aos outros no consumir, no ser feliz, no ser livre, porque esta é a ordem que inconscientemente receberam, e que cada um 'deve' obedecer, sob pena de se sentir diferente. nunca a diferença foi uma culpa tão assustadora como neste período de tolerância. a igualdade não foi conquistada de facto, mas é uma falsa igualdade recebida de presente. uma das características principais desta igualdade (..) é a tristeza: a alegria é sempre exagerada, exibicionista, agressiva, ofensiva.
- portugal, 2007 ? não, itália, 1974, segundo (pier paolo) pasolini.'

in mil folhas, jornal público, 19 de janeiro de 2007, página 8,
a propósito do ensaio 'escritos corsários. cartas luteranas. uma antologia', de pier paolo pasolini, assírio & alvim

está (estou) explicado

síndroma de stendhal:
alucinações em que por vezes incorrem indivíduos sujeitos a overdoses de arte clássica (particularmente em certas cidades italianas).

síndroma de jerusalém:
arrebatador sentimento de missão evangélica que certos viajantes experimentam ao visitar esta cidade.

síndroma de lisboa:
a explicação psi que algum dia usarão para me descrever.

william, it was really nothing ?

THIS CHARMING MAN

punctured bicycle
on a hillside desolate
will nature make a man of me yet?
when in this charming car
this charming man
why pamper life's complexities
when the leather runs smooth on the passenger seat?
i would go out tonight
but i haven't got a stitch to wear
this man said "it's gruesome
that someone so handsome should care"
a jumped-up pantry boy
who never knew his place
he said "return the rings"
he knows so much about these things
he knows so much about these things
i would go out tonight
but i haven't got a stitch to wear
this man said "it's gruesome
that someone so handsome should care"
this charming man
this charming man
a jumped-up pantry boy
who never knew his place
he said "return the ring"
he knows so much about these things
he knows so much about these things
he knows so much about these things

19 janeiro 2007

se.. (bom fim-de-semana)

if

if freckles were lovely, and day was night,
and measles were nice and a lie warn't a lie,
life would be delight,--
but things couldn't go right
for in such a sad plight
i wouldn't be i.

if earth was heaven and now was hence,
and past was present, and false was true,
there might be some sense
but i'd be in suspense
for on such a pretense
you wouldn't be you.

if fear was plucky, and globes were square,
and dirt was cleanly and tears were glee
things would seem fair,--
yet they'd all despair,
for if here was there
we wouldn't be we.

e.e. cummings

poeminha II

ela disse:
definitivamente obsessivo.
ele disse:
obsessivamente delicioso.
arriscaram o coro:
deliciosamente definitivo?
(mas queriam algo novo)
em uníssono e numa palavra, gritaram:
- simples: é simplesmente precioso.

18 janeiro 2007

postcards: 'the boy under influence'

micah p hinson is a solo musician from texas although when playing live has contract musicians playing on stage (made up of friends). micah paul hinson catapulted from being a skate-kid down on his luck to making one of the year’s finest and most critically acclaimed debut albums: 'micah p hinson & the gospel of progress'. in the meanwhile, a second studio album has been edited 'mich p hinson & the opera circuit', as well as other 'more underground' material.
- in wikipedia

"americana album of the month" 4/5 UNCUT
"raw, sophisticated and sublime folk and country-tingled epistles" 4/5 MOJO
"wracked but intimate thing of beauty" 4/5 INDEPENDENT
"the sun hasn't set on this boy" 4/5 TIMES
"sparse, broken ballads" 4/5 OBSERVER MUSIC MONTHLY
"the opera circuit confirms the talent releved in his acclaimed gospel of progess debut" 4/5 SUN
"gothic americana worth paying attention to" GUARDIAN
"tracks owe their roots to ray charles and country ballads" 4/5 DJ
"astonishing debut of cosmic country noir 9/10 NME
"truly, a gospel of redemption to believe in" 4/5 Uncut
"remarkable beauty 4/5 Mojo"
"up there with Bob Dylans Idiot Wind" 5/5 Times
"classic in the making 4/5" DJ
"wonderful stuff" Time Out

este rapaz de voz grave, profunda e soturna, profundamente melancólico e que grita palavras que oscilam entre o fogo e o gelo, tem uma história já quase mitificada (e que ele próprio alimenta): uma história de perda e de luto, de um amour-fou (com uma modelo de ocasião da americana 'vogue'). de uma adolescência de subúrbio, anódina e anónima, a uma paixão funesta, caminho escorradio para vícios farmacológicos, roubo de pacotilha, prisão, humilhação. de 'never been' to 'has been', em menos de um fósforo.
contudo, a redenção apareceu-lhe sob a forma de talento e determinação. e escreveu um disco - o tal disco de estreia - profundamente autobiográfico que é, com propriedade, o esconjurar dos seus demónios.
mais recentemente, aparece marcado na carne e no espírito por uma persistente dor de costas, que o imobilizou num hospital durante meses e que o fez regressar a uma insalubre dieta de comprimidos. mas que, de certa forma sinuosa, lhe permitiu também conceber e gravar o seu mais recente álbum, recorrendo a amigos e oscilando, físicamente, entre o próprio hospital e a sua casa de convalescente.
biografia a mais, obra a menos ? assim parece.
para tirarem as dúvidas, nada como colocar a girar o seu disco de estreia. e vejam com os vossos ouvidos e escutem com os vossos olhos e bebam com o vosso coração a assombrosa sequência de canções que este rapaz escreveu e que interpreta num registo sempre intimista, em que as palavras oscilam entre uma espécie de lamento sussurrado (em surdina) e um grito visceral (talvez com destinatário bem definido).
'micah p hinson and the gospel of choir' é uma obra rara. como quem começa uma catedral pelos vitrais, micah, aos 22 anos, chegou ao apuro perfeito da sua arte de convocar fantasmas, para melhor os destruir - uma ode a um amor arrebatador e total que já passou de prazo, deixando atrás de si feridas que é preciso cicatrizar.
a palavra por bisturi, a melodia por analgésico, a memória emocional como mesa de operação.. e a fúria as itself.

poeminha

chorar de alegria,
chorar de emoção.
chorar porque sim,
chorar porque não.
chorar sózinho,
chorar no ombro amigo.
chorar no vão de escada,
chorar em plena parada.
chorar pelo novo dia.
chorar pelo dia não.
chorar é forma de vida?
talvez sim, talvez não..
chorar visto de perto
é tão-só ter no lugar certo
um vivo e certeiro
coração.

17 janeiro 2007

esta manhã

esta manhã, enquanto conduzia, esperava, como tantas vezes, pelo 'em repeat' da radar - um hábito que ganhei, espécie de poção mágica para me atirar ao dia.
ouvia o genérico da rubrica e, num daqueles 'mind games' que todos temos, tentava adivinhar se o ouvinte do dia seria rapaz ou rapariga, rapaz ou rapariga, rapaz ou rapariga,
rapaz!
e de repente ali estava
ele
e de repente ali estava
eu,
que já me havia esquecido que um dia havia gravado aquele 'em repeat'..
escutei as minhas palavras, como se escutasse outra pessoa ('esta semana deu-me para aqui, não sei bem porquê') e ouvi religiosamente a canção
'poses', de rufus wainright.
no final, no seu jeito peculiar, a inês disse:
- 'ouvimos a canção que o joão ouve muitas vezes em repeat; deu-lhe para aqui, como ele disse, e deu-lhe muito bem, que não há melhor do que rufus'.
liguei para a radar e, sem chegar a tocar, atendeu a inês.
- 'que queria agradecer, a surpresa e as palavras' - disse eu.
e ela:
- 'eu é que agradeço. esta é daquelas que arrepia sempre, não é joão?'.
(é sim, inês, é daquelas que arrepia.)
lembro-me bem da noite em que descobri o disco do rufus wainright (que tem o título da canção - 'poses'); lembro-me muito bem de estar numa cama alheia, diletantemente estendido , às escuras, a olhar o céu-tecto forrado a estrelas e de ouvir o disco 2,3,4 vezes integralmente.
(é sim, inês, é daqueles que arrepia.)

the yellow walls are lined with portraits
and I've got my new red fetching leather jacket
all these poses such beautiful poses
makes any boy feel like picking up roses

there's never been such grave a matter
as comparing our new brand name black sunglasses
all these poses such beautiful poses
makes any boy feel as pretty as princes

the green autumnal parks conducting
all the city streets a wondrous chorus singing
all these poses oh how can you blame me
life is a game and true love is a trophy

and you said
watch my head about it
baby you said watch my head about it
my head about it
oh no oh no oh no
oh no oh no no kidding

reclined amongst these packs of reasons
for to smokes the days away into the evenings
all these poses of classical torture
ruined my mind like a snake in the orchard
i did go from wanting to be someone now
i'm drunk and wearing flip-flops on fifth avenue

once you've fallen from classical virtue
won't have a soul for to wake up and hold you

in the green autumnal parks conducting
all the city streets a wondrous chorus
singing all these poses now no longer boyish
made me a man ah but who cares what that is

and you said watch my head about it
baby you said watch my head about it
my head about it
oh no oh no oh no
oh no oh no well you said
watch my head about it
baby you said watch my head about it
my head about it
oh no oh no oh no
oh no oh no no kidding

(é sim, rufus, é como dizes:
'once you fall from classical virtue, soul is no more a sister holding you')

16 janeiro 2007

postcards: 'the fallen angel'

gram parsons (november 5, 1946 – september 19, 1973) was an american singer, songwriter, guitarist and pianist. a solo artist as well as a member of both the byrds and the flying burrito brothers, he is best known for a series of recordings which anticipate the so-called country rock of the 1970s and the alt-country movement that began around 1990. parsons described his records as "cosmic american music". he died of a drug overdose at the age of 26. in 2004, rolling dtone magazine ranked him #87 on their list of the 100 greatest artists of all time.
- in wikipedia

gram parsons foi uma daquelas pessoas apanhadas na curva do tempo: cedo demais para certas coisas, tarde demais para outras. algures entre as raízes country (ou country-folk) e uma linha mais rock, criou uma música estranha - muitas vezes pungente -, que 2 décadas depois teve continuidade naquilo que hoje conhecemos como americana, alternative country ou até new weird rock - espécie de música fusional que bebe nas raízes melódicamente tradicionais do country, recorre a letras sentimentais (mesmo que metafóricas e, por vezes, minimalistas) e incorpora princípios de arquitectura sonora (e a base instrumental) próprios do rock & roll.

gram parsons nunca teve um hit em vida e dividiu-se em múltiplos projectos - mais do que paralelos, ziguezagueantes -, como se também neste aspecto procurasse incessantemente o seu lugar no espaço e no tempo.

é importante lembrar gram parsons porque é um músico seminal. em poucos anos de carreira - espécie de maldição james-deanesca ('live fast, die young, leave a beautiful corpse') -, deixou um legado em bruto - algo por acabar - que influenciou pelo menos as 3 gerações seguintes nos estados unidos. a palavra italiana aggiornamento aplica-se aqui com propriedade, porque foi isso que parsons fez a uma base tradicional já na altura anacrónica (o country à la nashville).

nas suas biografias abundam os qualificativos 'grievous angel' e 'fallen angel' - anjo de wenders, perdido entre céu e terra, oscilante entre as raízes populares e o futuro do rock, à procura da linguagem certa sobre 'as ruas de baltimore' (título de uma sua canção).

15 janeiro 2007

natal em janeiro

esta noite aconteceu-me uma coisa extraordinária.
ou será que sonhei que me tinha acontecido uma coisa extraordinária?
ou será que sonhei que tinha sonhado com uma coisa extraordinária?

esta noite - entre sono e sonho, entre vigília e vigia -, debrucei-me sobre desenhos maternais, azuis flamejantes (mas serenos), prendas mágicas de natal.

acordei com um sorriso interior e com a palavra alquimia a dependurar-se-me nos lábios.

:esta noite foi uma noite cheia, outra vez)

postcards: 'the starsailor'

timothy charles buckley III (february 14, 1947 – june 29, 1975) was an experimental vocalist and performer who incorporated jazz, psychedelia, funk, soul, and avant-garde rock in a short career spanning the late 1960s and early 1970s.
buckley often regarded his voice as an instrument, a talent most exploited on his albums g
oodbye and hello, lorca, and starsailor.
he was married to mary guibert, with whom he had a child, musician and singer jeff buckley, also known for his three-and-a-half octave voice, who died in 1997.
- in wikipedia

isto é dizer quase nada sobre este rapaz que navegava por entre as estrelas. mais, muito mais, dizem as canções.
abaixo encontram uma pequenina seleccção pessoal - 7 canções que nos revelam um rapaz extraordinário (tim) que, por um daqueles sentidos cujo alcance último não descortinamos, foi pai de outro rapaz extraordinário (jeff).
a mim, quando me falam de linhagens de sangue, de uma certa forma de nobreza hereditária, lembro-me sempre de um nome: 'buckley'.

morning glory
dolphins
happy time
once i was
song to the siren
hallucinations
sing a song for you

inquietação subliminar

1. o facto

ontem, ao passar os olhos pelo jornal, deparei-me com a (já habitual) cobertura noticiosa da actividade dos movimentos 'pelo sim' e 'pelo não' relativamente ao referendo de fevereiro.

chamou-me a atenção uma foto, tirada a partir da 'mesa de honra' de um encontro de simpatizantes do não. o plano foi captado abrangendo as costas dos 3 palestrantes de ocasião (descortinavam-se 2 cavalheiros ladeando a Laurinda Alves); depois da mesa, ao fundo e de frente para nós, a audiência daquela sessão de esclarecimento. que víamos nós na audiência ? dezenas de mulheres, classe média-alta provavelmente, arriscaria que com mais de 50 anos, na sua larga maioria.

2. a inquietação

uma lei, e principalmente uma lei desta natureza (simpatize-se ou não com o facto de poder haver legislação sobre uma questão de consciência), afectará potencialmente mais do que uma geração. daqui decorre que todos os cidadãos terão, penso, direito a exprimirem a sua posição (com significativa probabilidade de se tornar vinculativa), não obstante serem ou não pais ou desejarem ou não (ou poderem ou não) vir a ser pais - porque afectará os seus filhos, porque pode vir a afectar eventuais filhos (mesmo que agora não 'planeados'), porque afectará a comunidade no que tem de mais basilar (auto-sustentabilidade, cidadania, etc.). não vale a pena lembrar o triste episódio do Francisco Louçã, de certa forma caindo na hábil argumentação do Paulo Portas, afirmando que este último, não sendo pai, não podia exprimir-se sobre este mesmo tema - é claro, pelo menos para mim, que a democracia não deve ser de geometria variável - tem riscos e limitações, mas, como dizia o outro, ainda é o melhorzinho que podemos encontrar.

isto para dizer que, não obstante achar que todos temos direito a exprimir a nossa posição, não deixo de achar perturbante:

- a consistência sociológica daquela audiência fotografada (tira representatividade, entendem ?);
- o facto estatístico e político de, em tese, o 'sim' ou o 'não' poderem tornar-se vinculativos (em termos de despenalização da IVG até às 10 semanas, que é o que estamos a discutir) em virtude de votos de pessoas que já não estão 'em idade fértil' - desculpem-me a relativa crueza da expressão - (tira legitimidade, entendem ?);
- a demagogia serôdia, altamente manipulatória e desonesta, que vejo apresentada em certas tomadas de posição (e posso adiantar que a encontramos em ambos os campos, ainda que, na minha modesta opinião, o lado mais conservador use e abuse da mesma com franca vantagem..).

quem me conhece, sabe que não gosto de discutir publicamente assuntos de índole pessoal, em matérias de costumes, religião, política. mas, às vezes, o que vamos vendo não nos permite ficar simplesmente calados, em mero diálogo com as nossas vozes interiores.

14 janeiro 2007

graffiti: keith jarrett meets tim buckley by the sea

bonito, surpreendente, natural.
doce.

12 janeiro 2007

flores de janeiro

though nothing can bring back the hour
of splendour in the grass, of glory in the flower;
we will grieve not, rather find
strength in what remains behind.

wordsworth


there are worse things than
being alone
but it often takes decades
to realize this
and most often
when you do
it´s too late
and there´s nothing worse
than
too late.

charles bukowsky

fractais XII: touché

'eu vinha para a vida e dão-me dias'

ruy belo

10 janeiro 2007

a naifa: perigo de explosão

é melhor
fechares
os olhos, meu
amor,
antes que o
mundo
inteiro seja um
incêndio.

os ventos todos
fechados dentro
da minha mão.
quantos ciclones
queres ?

procurava
nos outros
a ternura, mas
só encontrava poços cheios
de ódio e
nitroglicerina.

aquele
poema,
ao contrário
dos outros,
tinha pólvora.
só lhe faltava
o rastilho.

éramos
rebeldes por
sistema, a sonhar uma
revolução por dia. à
tardinha, na esplanada,
bebíamos um
cocktail molotov.

o terrorista
apaixonado
carregava, às
escondidas,
uma bomba
-relógio. era
no peito. era o
coração.

josé mário silva
para projecto 'a naifa', in 'canções subterrâneas'

08 janeiro 2007

the year of magical thinking - an introduction

aviso: post não aconselhável a pessoas mais sensíveis.

encontrei ontem à venda as edições original e traduzida de um livro que descobri - como tantas outras coisas -, nas páginas do 'mil folhas': 'the year of magical thinking / o ano do pensamento mágico', de joan didion.

joan didion é uma conhecida e reputada escritora nova-iorquina, na casa dos sessentas, que viveu, entre final de Dezembro de 2003 e Abril de 2004, uma experiência limite. viu a sua filha ser internada com uma infecção muitíssimo grave e de prognóstico reservado; assistiu à morte do seu marido, de ataque cardíaco fulminante, à sua frente, em pleno jantar doméstico; confrontou-se com a morte da filha, poucos meses depois (quando a julgava francamente recuperada).

perante 'o instante em que tudo muda', perante a banalidade com que tudo muda, por entre a náusea e a fragilidade extremas, joan didion agarrou-se ao seu pensamento, à sua fome de entendimento, à observação minuciosa de si própria, a uma busca incessante de explicação. leu tudo sobre a morte e o luto, descobriu estudos clínicos em bibliotecas obscuras, procurou médicos e psicólogos, profissionais habituados a lidar com a morte (e com as implicações na vida dos sobreviventes).. o resultado desta procura compulsiva - em jeito de narrativa enxuta, despojada de sentimentalismo, por exemplo, latino - é um livro que nos interpela, um relato pessoal e pungente (e sempre inteligente, no sentido possível da palavra) de uma viagem por alguns dos abismos que mais tememos. e que instintivamente afastamos da nossa vida, o mais que podemos.

ainda estou a meio do livro. palpita-me que voltarei aqui para falar mais um bocadinho dele e da experiência que está a ser mergulhar a pique neste 'ano do pensamento mágico'.

como dizia uma personagem de um conto de flannery o'connor: 'sabe, é preciso um bocadinho de tudo para fazer o mundo'.

até dói.

07 janeiro 2007

d-o-m-i-n-g-o

dizem que o século XXI será 'o século das mulheres'.
bem me parecia que habitava já (n)o futuro.

fragmentos & estilhaços & etc

'a pedra que rola da vertente / segundos depois de passares'
rui lage, in revólver

'também somos aquilo a que dizemos não'
'um verso / que nos atinge no meio da escuridão'
jorge gomes miranda, in falésias

'o gelo queima, mas em nós um secreto fogo queima o gelo'
luis quintais, in canto onde

'entender / de súbito que tudo é por acaso'
'amor / onde sempre vivi acima das minhas posses'
(palavras) 'o próprio pano de que é feita a solidão'
rui pires cabral, in capitais da solidão

'vão cães acesos pela noite'
alexandre nave, in vão cães acesos pela noite

'estou a morrer e ninguém me diz se por desuso / ou educado / esquecimento'
eduarda chiote, in o meu lugar à mesa

06 janeiro 2007

à espera no centeio

o meu nome hoje é holden, holden caulfield.
alguém que encontra alguém que atravessa o centeio - isso gostava de ser.
alguém que apanha alguém que atravessa o centeio - isso é que era.

05 janeiro 2007

bom fim-de-semana

'da voz das coisas'

só a rajada de vento
dá o som lírico
às pás do moinho.

somente as coisas
tocadas pelo amor das outras
têm voz.

fiama hasse pais brandão

04 janeiro 2007

show me your x'mas gifts and i will tell you who you are

quem sou eu ?

- livro: 'boris vian', por boris vian (selecção de textos avulsos, citações, etc.)
- livro: '1001 discos para ouvir antes de morrer'
- livro: 'the book of longing', leonard cohen, edição inglesa
- uma gravatita com muita classe (da minha marca favorita e quase exclusiva.. em gravatas!)
- um par de luvas (sim: quentinhas; sim: bonitas; sim: discretas)
- uma singela camisa lisa, castanho-terra, com um toquezinho especial..
- um inesperado leitor de dvds / cds / mp3 portátil (esta foi profissional, note-se!)
- um muito adequado voucher para uma excelente massagem num spa bem conhecido da nossa praça..
- uma bela garrafita de vinho generoso ('de gelo', creio ser a designação correcta, nome de uma técnica alemã), 'flp' - uma experiência de filipa e luis pato, bairrada
- as incontornáveis peças de roupa interior ('season underwear'), cujo estendal me vou abster de erguer em praça pública, em nome do bom-gosto :-)
- uma tentativa querida de me arranjar mais 1 hora de programa na radar - infelizmente, foram insensíveis às tentativas de 'suborno light' (para mim as intenções contam; para mim as tentativas valem)
- um conjunto criativo (no mínimo!) de ambientadores de sala, incluindo, por exemplo, gotas para se deitarem por cima das lâmpadas acesas, libertando vapores aromáticos..
- o mais importante (e que tem o mérito de ser mesmo verdade): os gestos de amizade e ternura que, nalguns casos imerecidamente, vieram até mim.

a todos o meu obrigado!

03 janeiro 2007

the road not taken

two roads diverged in a yellow wood,
and sorry i could not travel both
and be one traveler, long i stood
and looked down one as far as I could
to where it bent in the undergrowth;

then took the other, as just as fair
and having perhaps the better claim,
because it was grassy and wanted wear;
though as for that, the passing there
had worn them really about the same,

and both that morning equally lay
in leaves no step had trodden black
oh, i kept the first for another day!
yet knowing how way leads on to way,
i doubted if i should ever come back.

i shall be telling this with a sigh
somewhere ages and ages hence:
two roads diverged in a wood,
and i -- i took the one less traveled by,
and that has made all the difference.

robert lee frost

balanços: o que eles dizem

02 janeiro 2007

balanços: personal favourites 2006 (I)

cinema:

foi, talvez, o pior ano para o meu eu cinéfilo. vi pouco cinema, passou-me muita coisa ao lado (ou então eu é que passei ao lado de muita coisa). em todo o caso, aqui ficam algumas pistas que retive, correspondendo aos momentos de maior fruição e prazer (intelectual, nalguns casos; emocional, noutros tantos).
ficam de fora as sessões na cinemateca, que não contam para 'este totobola'.

janeiro - 'nada a esconder'; 'match point'
fevereiro - 'o segredo de brokeback mountain'; 'walk the line'
março - 'boa noite, e boa sorte'; 'uma história de violência'*
abril - 'eu, tu e todos os que conhecemos'
maio - 'o novo mundo'*; 'o tempo que resta'*
junho - 'a lula e a baleia'
julho -
agosto - 'miami vice'; 'os amantes regulares'
setembro - 'sonhar com xangai'
outubro - 'volver- voltar'
novembro - 'em paris'*
dezembro - 'uma família à beira de um ataque de nervos'

* filmes que não vi, mas nos quais apostava alguns cobres..

2007 visto por outros jardins, jardins amigos (ou será 2006 ?)

novo ano
terminada a nostalgia, preparo-me para o ano
que está por estrear.
novo em folha, como os cadernos no início de setembro.
(uma flor de: cristal)


o citador brindou-me hoje com esta bonita frase do camus: 'a verdadeira generosidade para com o futuro consiste em dar tudo ao presente'.
não consigo pensar em melhores palavras para "enfrentar" o novo ano que está quase aí ao virar da esquina. não sei o que me espera em 2007, não sei se será melhor ou pior que 2006. não sei se anseie por grandes mudanças ou se desejo que apenas corra um bocadinho melhor que o ano que agora termina. não sou pessoa para ficar a meditar longamente sobre isso. prefiro pensar que com mais um revolver deste nosso pedaço de rocha onde todos vivemos nos tornemos todos melhores seres humanos. pelo menos assim o desejo com todas as fibras do meu corpo. boa recta final e um melhor início de um novo caminho anual. para nós todos.
(uma flor de: nuno guronsan)


'specters move like pilot flames / their widows toast at st. angel / better times collide with now / the tears were warm, i feel them still / their heat to vapor and disperse / and cloud our eyes with weary glaze // you raise your glass and may exclaim / iI'll put my hands on the truth by God" / but it's faster, love, than you and me / faster than the speed of gravity / that's how it catches you from falling / and how it always slips away // specters move like pilot flames / their widows toast at st. angel / better times collide with now / and better times / and better times are coming still.'
um ressonante 2007!
(uma flor de: ricardo mariano)


last year's words
'for last year’s words belong to last year’s language
and next year’s words await another voice.'
t s eliot
(uma flor de: pedro mexia)


DOIS MIL E SETE.
vai ser um bom ano. tem de ser. agora sim.
(uma flor de: abssinto)


NOVA, CADA MANHÃ
'cada manhã é um começo renovado,
ouve o que te diz, minha alma, o alegre refrão.
e, apesar de velhos lamentos
e de pecados mais velhos ainda,
apesar dos problemas que hão-de vir
e do previsível sofrimento,
une o teu coração ao dia e começa outra vez.'
susan coolidge(1835-1905)
trad. hmp
(uma flor de: helder moura pereira)

noruz (novo dia)

o 'noruz' - efeméride associada ao novo ano, na cultura e língua persas - começa a 21 de março.
por mim, começava já.
mas, entre janeiro e março, o importante é que comece.
para eles e para nós, oriente e ocidente.
bem precisamos de um 'noruz': novo, límpido, clarividente.
digam comigo: 'noruz', 'noruz', 'noruz'.
assim seja.