22 agosto 2011


memento mori

nunca gostou de fotografias,
principalmente das pessoas que amara.

nunca gostou de poemas,
principalmente quando escritos por ele.

nunca gostou de perfumes,
principalmente quando eternizados na sua memória.

perfumes,
poemas,
fotografias,
pedras tumulares que algum dia lhe darão paz?

até lá, vai exercendo o poder da escolha,
virando costas a esse privado cemitério in progress.

no consultório, alguns dias depois, falava de luto.
enquanto a doutora, precisava: mais do que luto, falava-se de aniquilação.
quem sabe, sabe - pensou para com ele - e saíu, convencido, porta fora.

mais tarde, lembrou-se do conceito de memento mori,
e vieram-lhe à memória as velhinhas polaroids de figuras extintas,
os filmes caseiros ainda em super 8 sem som,
umas quantas lágrimas enxutas
(estas últimas à cara, mais do que à memória).

as metáforas estão todas mortas, tal como as rosas
era um verso que escrevera uns anos antes
e legenda habitual desses dias sombrios.

agora, escreve fados vadios, surripiando palavras kitsch onde pode:
um momento, amor, espera por mim, lá no banco do jardim.

tudo o que tivera, perdera. tudo o que tem, deve a alguém.
ficaram-lhe as fotos, as metáforas, as rosas, os perfumes, os poemas,
um mausoléu feito de memória
uns quantos euros.. três telefones partidos..
e, deixa ver,
..quase mais nada, quase mais ninguém.