10 julho 2010

quando abrimos as páginas do caderno Economia, do jornal Expresso, e damos de caras com um poema como 'diana of love', de rui pires cabral, fechamos os olhos e sentimos que, contra todas as macro e microeconomias do mundo, afinal ainda há salvação. e se ainda pode haver salvação para o mundo, talvez ainda possa existir redenção para nós próprios. a beleza da metafísica é esta.


Estávamos em Londres naquele dia de Setembro
em que foi a enterrar a Princesa do Povo. Não havia
barulho nos passeios, não havia casa aberta
onde pudéssemos comprar qualquer coisa
para merendar na relva de St James ou Kensington
Gardens: os próprios parques tinham mergulhado
num lutuoso torpor. Sentados à sombra, nós os dois

estávamos exactamente a meio da nossa história.
Para trás, a lenta cadeia de acasos que culminou
no encontro a desoras sob os astros duma gruta;
pela frente, todos os maus passos que, somados,
haveriam de ditar o nosso fim. Mas nessa tarde
de sol e silêncio, enquanto a Inglaterra chorava
aquela que na morte teve o nome do amor,

estávamos juntos ainda – e sei que fomos felizes
na cidade mais triste do mundo. Era sábado,
uma mulher que passava vendeu-me um ramo
de rosmaninho (for remembrance, dear): largos meses
murchou numa gaveta. E quando dele me desfiz
já não era um memento por Diana, mas o último
vestígio de um amor tão morto quanto ela.



rui pires cabral