12 julho 2010


era o dia seguinte à vitória de nuestros hermanos
corolário glorioso das olimpíadas de noventa e dois
vinte anos quase de esforço dedicação devoção
agora a glória (o lema do leão tem préstimo linguístico)

pensas como é difícil escrever sem pontuação
mas não naquele jeito moderninho tão português antes
de uma forma verdadeiramente refundadora da
respiração dos leitores (e respirar é viver)

querias à força meter no poema o manuel de freitas
que te inundou a tarde e a noite por entre futebol
e alegrias estranhas porque não tuas porque não vivas
tal como querias tão-só dizer mostrar lembrar o quão

difícil pode ser escrever poesia logo pela manhã
sem teres à mão fogo metafísico as dores vividas do dia
uma coisa qualquer que funcione como fulminante fulminante
(adjectivo e substantivo convém explicar este uso duplo

da palavra fulminante ao mesmo tempo mecânica de repetição)
aprendeste ontem que o poema qualquer poema não deve ter
palavras a mais nem palavras a menos antes as justas
daí ser tão difícil de praticar com a mestria que não ousas

mas dizias já lá bem atrás que é difícil escrever poesia
de manhã tal como é difícil escrever poesia em dias claros
ou como neste preciso e cartografado hoje aqui estou sim
em que quando te deitares serás provavelmente tio crente

nos mistérios da vida outra vez e em toda a vitalista
crença de que às vezes se a poesia mata outras tantas te
salva da prosa da vida como se a poesia mesmo sem acentos
e demais pontuação recusasse o papel testamenteiro e vil

que muitos lhe outorgam não hoje dizes para ti próprio
enquanto olhas o relógio que marca umas imprecisas dez
não hoje e recusas o abraço de urso da poesia enquanto
improvavelmente te diriges sózinho da margem para esse

estranho e externo a ti país - o da vida e o da alegria