24 março 2010


'love is my only devotion'


um sms cruza a manhã, dizendo-me: "bom dia! grande escolha!". pergunto, de volta, a que se refere tão simpática declaração. na volta da volta, a mesma palavra amiga diz-me: "na radar, em repeat - escolheste a canção 'ten nights', dos spain". sorrio.

em 2006, as minhas aventuras radiofónicas começaram assim. fui, se a memória me não falha, o terceiro ouvinte da radar a programar 'a hora do bolo', o tal programinha em que os ouvintes fazem de radialistas, ao sábado à tarde. ao mesmo tempo que gravava o programa, pediram-me para deixar também o meu contributo para a rubrica 'em repeat'. deixei uma mão cheia de canções, as que me ocorreram naquele momento. se bem me lembro: lloyd cole, leonard cohen, jens lekman, rufus wainwright, os spain.. coisas assim, que foram passando na rádio, ao longo do tempo.

depois, bem, depois a minhas aventuras com a rádio continuaram, através desse programa-experiência que foi a 'estação de inverno', na rádio zero. 76 edições unindo 'a música que há na poesia' e 'a poesia que há na música', para citar directamente a declaração de intenções que consta da matriz do programa. um programa feito de amadorismo, amor fulminante pelas palavras, uma vontade avassaladora de mostrar ao mundo as canções que fazem o meu mundo. acabei esgotado, exaurido, perigosamente perto de algo que ainda não sei muito bem articular mas que, senti, não seria um sítio bonito. e assim, ao fim de 2 anos de emissões, a 'estação de inverno' chegou ao fim. foi bonito, foi lindo, e, como disse o poeta brasileiro, como o amor, foi eterno, enquanto durou.

rewind. estamos em outubro ou novembro de 2006. chamas-te joão, tens 33 para 34 anos de idade, o teu mundo é feito do que foi e do muito que havia ainda de vir e que não podias adivinhar.

forward. estamos em março de 2010. chamas-te joão, tens 37 para 38 anos de idade, o teu mundo é feito do que foi e do muito que ainda há-de vir e que não podes adivinhar.

entre uma coisa e outra: o mundo. a rádio. a vida. confesso que vivi, como dizia o outro. agora, é tempo de outra coisa.

entretanto, olhamos esse wenderiano movimento em falso e o que vemos? um lentíssimo travelling em tons esbatidos - cores que se apagam num preto e branco crespuscular, mas ainda luminoso -, enquanto o realizador fecha a claquete. nela, pode ler-se:

'um rapaz no inverno', cena 1, take 765.

como se sísifo descesse do olimpo e assumisse um rosto humano - agora e para sempre, por todos os séculos dos séculos. amén.