13 julho 2009

uma carta de joão blake que nos chegou às mãos..


pede-me o joão blake para, em seu nome, vos transmitir as seguintes palavras:


e assim chegamos ao final, 39 programas depois, desta segunda época da 'estação de inverno', um programa que tem tentado, conforme expresso na sua declaração de intenções, 'encontrar a música que há na poesia; e a poesia que há na música'. en passant, aproveitando para fazer a justa, merecida e urgente divulgação daqueles poetas portugueses, em regra nossos contemporâneos, que vale a pena conhecer. e que, surpresa para muitos, são em número bastante mais generoso do que aquele que poderíamos antecipar, por exemplo, lendo algumas exigentes análises críticas que vão sendo produzidas a propósito da poesia criada em Portugal nestes últimos quarenta anos.. (sim, estou a ser aqui um bocadinho irónico).

foram 39 programas, como tinham já sido os 37 programas correspondentes à primeira época da 'estação de inverno', em que tentámos fazer o nosso melhor, cientes, desde a primeira hora, do nosso amadorismo e muito rudimentar domínio dos aspectos mais técnicos envolvidos na concepção, realização e condução de qualquer programa de rádio (e deste em particular, por certos condicionalismos da sua arquitectura sonora, digamos assim, nem sempre fáceis de resolver).

há uma expressão inglesa de que muito gosto, como bem sabem os poucos fiéis que me acompanham: 'a labour of love'. assim foi. a 'estação de inverno' mais não foi, mais não é, do que uma expressão desse amor que sinto pelas coisas bonitas (mesmo que desalegres), pelas coisas autênticas, pelas palavras incandescentes, pelas melodias que nos espantam os sentidos, pela urgência com que certas coisas são escritas ou cantadas, pela furiosa humanidade que a arte sempre significa, mesmo quando toca os domínios da metafísica. 'a labour of love' também pelos 'poetas dos 300 exemplares', aqueles seres que resistem ao esquecimento, ao silêncio, ao grande deserto da velocidade contemporânea. e ainda 'a labour of love' porque este programa foi feito para ti, estimado(a) leitor(a) e ouvinte, para as tuas noites de inverno em que te sentes tão sózinho(a) no mundo como eu me senti, tantas e tantas vezes, no estúdio onde gravo a 'estação'. sózinho, a sós comigo e com a poesia e com a música. e o mundo, inteirinho, lá fora. ou melhor, de fora.

por ser justo, agradeço a toda a equipa da rádio zero o apoio. em especial ao joão bacalhau, director de programação e meu autêntico tutor nos primeiros tempos. e ao ricardo reis, presidente da rádio e ouvinte atento e interessado do programa. muito obrigado, também, aos outros todos, cujos nomes seria talvez fastidioso aqui enumerar. eles e elas sabem quem são.

outra palavra, muito importante, para o ricardo mariano (o 'senhor vidro azul', esse mesmo) que me serviu de inspiração pessoal - tal como o seu 'vidro azul' me serviu de mote para a criação da arquitectura conceptual e afectiva da 'estação'.

uma palavra também para as pessoas que me acompanharam nos primeiros programas, mesmo que à distância, incentivando-me a continuar. por ser também justa, uma palavra para a mar, a lebre do arrozal, a ana s., a ana c., a conceição r., a sónia b., e para mais umas quantas pessoas que, semana após semana, enquanto o programa não levantava vôo, enquanto não entrava em velocidade cruzeiro, me deram, gentil e graciosamente, aquele suplemento de alma que sempre fez, faz e fará toda a diferença.

ao diogo vaz pinto, da revista criatura, ao manuel de freitas, da editora averno, e ao tiago nené, do texto-al, o meu muito obrigado pelo pontual mas certeiro sinal de que certas coisas valem a pena, de que a estrada faz-se para nela seguirmos viagem. com coragem e, desculpem a palavra tão gasta, com amor.

finalmente, e antes de me despedir de ti, ouvinte e leitor anónimo, uma breve referência de natureza diferente. aos meus fantasmas concretos, aos abutres abstractos, aos espectros nocturnos, aos ventos gelados dos meus longos invernos metafóricos: sem vós, não teria existido a 'estação de inverno' ou, pelo menos, esta 'estação de inverno'.. this one has been, therefore, also for you, demons of mine.

a ti, meu leitor, meu ouvinte, anónimo e amigo: que estejas hoje mais humano, ao fim destes 76 programas, são os meus mais sinceros votos. porque a beleza desprovida de uma ética é falsa. e porque toda a ética é bela.

para terminar, e porque temos na vida que ter especial cuidado com a forma como desferimos o remate final, tal como o john darnielle, dos mountain goats (e com sua generosa licença): dedico esta segunda época do programa à luz improvável pela qual espero e anseio todas as noites da minha vida.

sejam felizes.


joão blake

lisboa, julho de 2009.




[se acharem o texto com um tudo-nada melodramático, paciência. hoje estamos assim, amanhã não sabemos. nem sequer se vamos cá estar, não é?]

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Olá Gi.

Em memória dos bons novos tempos, venho para recordar.

Ao 2º post, do terceiro dia de vida deste blog, lançaste um repto: quem será o 'quase' super-homem, o maior português de sempre.

É agora hora de, centenas de dias, horas e post's depois, veementemente, reafirmar:

""
seria injusto votar (para maior português de sempre) num super herói, que detém poderes extraordinários.

justo é, de facto, votar em quem faz a diferença, com os parcos infinitos recursos de que todos dispomos.

fazer a diferença, ser um grande ser humano, é fazer pequenas coisas, por opção, porque mesmo essas, a maioria - dos outros - não faz.

depois, não há rankings... ou se é, ou não.

(...)""

Nada, rigorosamente nada do aqui dito ao longo destes 3 anos é falso.

Cada letra publicada resplandece da verdade encontrada, a cada momento, por uma alma luminosa (ver foto), uma alma, que, no entanto, veste, por vezes, um fato escuro (tal como na foto).

Cada palavra representa uma pequena idéia, muitas vezes brilhantemente simples, muitas outras, simplesmente brilhante.

Cada frase é um pequeno gesto, uma célula de ti que faz a diferença neste mundo.

Cada post é uma simples e pequena coisa, feita por ti, oferecida a todos.

E a recompensa?

Feliz daquele que, mesmo à distância, com toda a frieza que teclado e ecrâ podem representar, multiplica amigos, companheiros para uma nova jorna.

Feliz aquele que faz a viajem ao mais profundo âmago do seu íntimo, da sua sensibilidade, e consegue voltar mais forte.

Feliz por ter sorte!?

Não!

Feliz por ser João!

Chamam-te uns, "Senhor"

Chamam-te outros, simplesmente, "João"

Acredito que muitos, entre os anteriores e tantos outros, os que te conhecem verdadeiramente, no seu intimo, te chamam, Gi.

...

Aproxima-se uma pausa por aqui.

Alguém disse uma vez: "foi um grande trabalho limpar o armário desses esqueletos - tratemos agora, de limpar os fantasmas!"

...

Primeiro post, primeiro dia (adaptado):

é tempo de voltar à vida simples.
é tempo de voltar à vida.
é tempo de voltar.
é tempo.

""
(...)
por mim, voto em ti!
""

Até sempre, amigo!

dm

segunda-feira, julho 13, 2009 10:35:00 da tarde  

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