que idade, rapaz?
nunca percebeste inteiramente o que é um verbo transitivo
mas sempre suspeitaste que não andaria longe dessa coisa
que é a imparável marcha do tempo, com a sua corte de
despojos e destroços, impiedosamente deixados para trás.
agora que a primavera se anuncia por entre as ruínas da
tua cidade, branca e dourada como só nos sonhos sabe ser,
lembras-te desses longos dias de adolescência, inventando
jogos mil e coisas que, anos depois, vieste descobrir no
discurso fluente desse moderno imperador que reina em milão
- mind games, precisamente.
nessas tarde infinitas, nessas manhã de azuis rebentando
em direcções totais, nesses volteios do relógio que se
impunha aos teus ritmos de rapazola em processo pleno de
crescimento, sabias encontrar na beira da estrada, no bico
de um pardal, nos caminhos que descobrias sempre montado
na tua bicicleta ou, um pouco mais tarde, na motoreta do
avô, um universo impoluto, aventuroso, formidável em tudo
o que te dava e, como se não bastasse, no que te prometia.
era o tempo dos relatos de rádio, das futeboladas por tudo
e por nada, dos épicos despiques em carrinho de esferas,
da descoberta das músicas do mundo (sempre tão importantes).
de quando em vez, aos pinotes, archote em combustão total,
saltavas de janela em janela, pulavas por cima do sofá lá
de casa e suspendias esse juvenil frenesim de frente para
a televisão: sporting e benfica (buuuhhhhhh!), a volta a
portugal em bicicleta, os mundiais de atletismo, os jogos
olímpicos em todas as suas declinações - altius, fortius,
como era mesmo? -, coisas próprias de um rapaz de província
furiosamente interessado pelas coisas do mundo. futebol e
franz kafka, ocultismo e alain prost, joaquim agostinho por
entre grossos tomos de história - fome de tudo, que dizer..
no dia da morte de joaquim agostinho, tinhas 11 anos.
no dia da morte de ayrton senna, tinhas 21 anos.
e no dia da morte da vida, que idade tinhas tu, rapaz?
1 Comments:
Quando o Senna nos deixou, naquela malfadada curva, tinha eu 17 anos, Gi.
As tuas palavras continuam sublimes, como poucas...
Furtei a foto para o Espaço, não resisti.
Abraço.
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