15 dezembro 2008

o homem desmultiplicado


hoje sonhei contigo. num cenário de guerrilha africana, andavas por lá, sem eu perceber muito bem porquê. talvez nem tu.

hoje vi-te, numa paragem de autocarro - microssegundo em deflagração. talvez não me tenhas visto. mas talvez tenhas sonhado comigo, num cenário de guerrilha urbana.

pobres modernos, crivados de poemas e palavras. feridos por filmes e afectos em perda. escravos dessa lenga-lenga desolada e fria que é, por vezes, a memória.

condenados em vida a viver por dez. e viver é (também) sofrer. sete vidas tem o gato. dez vidas temos nós - e todas a acontecer ao mesmo tempo. melhor seria não as ter. não nos permitem recomeçar, uma e outra vez. não nos permitem arriscar, como se desta vez é que fosse a sério, aposta desmedida, suportada pelas malhas de uma rede metafórica.

as melhores metáforas estão mortas, como as rosas.

a maldição do homem desmultiplicado é esta: viver em 'loop' permanente, carrossel feérico e fantasmagórico, solilóquio sem interlocutor, num 'huis clos' que suga a seiva e salga o sangue.

e assim. multiplicado(s) por dez.