our turn (but is there a way out?)
A NOSSA VEZ
é o frio que nos tolhe ao domingo
no inverno, quando mais rareia
a esperança. são certas fixações
da consciência, coisas que andam
pela casa à procura de um lugar
e entram clandestinas no poema.
são os envelopes da companhia
da água, a faca suja de manteiga
na toalha, esse trilho que deixamos
atrás de nós e se decifra sem esforço
nem proveito. é a espera
e a demora. são as ruas sossegadas
à hora do telejornal e os talheres
da vizinhança a retinir. é a deriva
nocturna da memória: é o medo
de termos perdido sem querer
a nossa vez.
THIS WAY OUT
mas há uma saída? imagina
na insónia as florestas que crescem
a essas horas noutras regiões, os comboios
que as atravessam para alcançar um destino
no futuro dos outros.
há uma saída? imagina
a noite cheia de cidades violentas,
o retumbar das máquinas nos subterrâneos
e a chuva a cair no plástico negro
dos morangais, todo o sofrimento
e incerteza do mundo.
e de manhã, repara, está bonito
o tempo. os amigos acordam no quarto ao lado,
descem à cozinha para fazer o café.
mas há uma saída?
rui pires cabral, in 'longe da aldeia'
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