17 julho 2009

[pause]

15 julho 2009

o que ficará dos longos caminhos da memória

13 julho 2009

uma carta de joão blake que nos chegou às mãos..


pede-me o joão blake para, em seu nome, vos transmitir as seguintes palavras:


e assim chegamos ao final, 39 programas depois, desta segunda época da 'estação de inverno', um programa que tem tentado, conforme expresso na sua declaração de intenções, 'encontrar a música que há na poesia; e a poesia que há na música'. en passant, aproveitando para fazer a justa, merecida e urgente divulgação daqueles poetas portugueses, em regra nossos contemporâneos, que vale a pena conhecer. e que, surpresa para muitos, são em número bastante mais generoso do que aquele que poderíamos antecipar, por exemplo, lendo algumas exigentes análises críticas que vão sendo produzidas a propósito da poesia criada em Portugal nestes últimos quarenta anos.. (sim, estou a ser aqui um bocadinho irónico).

foram 39 programas, como tinham já sido os 37 programas correspondentes à primeira época da 'estação de inverno', em que tentámos fazer o nosso melhor, cientes, desde a primeira hora, do nosso amadorismo e muito rudimentar domínio dos aspectos mais técnicos envolvidos na concepção, realização e condução de qualquer programa de rádio (e deste em particular, por certos condicionalismos da sua arquitectura sonora, digamos assim, nem sempre fáceis de resolver).

há uma expressão inglesa de que muito gosto, como bem sabem os poucos fiéis que me acompanham: 'a labour of love'. assim foi. a 'estação de inverno' mais não foi, mais não é, do que uma expressão desse amor que sinto pelas coisas bonitas (mesmo que desalegres), pelas coisas autênticas, pelas palavras incandescentes, pelas melodias que nos espantam os sentidos, pela urgência com que certas coisas são escritas ou cantadas, pela furiosa humanidade que a arte sempre significa, mesmo quando toca os domínios da metafísica. 'a labour of love' também pelos 'poetas dos 300 exemplares', aqueles seres que resistem ao esquecimento, ao silêncio, ao grande deserto da velocidade contemporânea. e ainda 'a labour of love' porque este programa foi feito para ti, estimado(a) leitor(a) e ouvinte, para as tuas noites de inverno em que te sentes tão sózinho(a) no mundo como eu me senti, tantas e tantas vezes, no estúdio onde gravo a 'estação'. sózinho, a sós comigo e com a poesia e com a música. e o mundo, inteirinho, lá fora. ou melhor, de fora.

por ser justo, agradeço a toda a equipa da rádio zero o apoio. em especial ao joão bacalhau, director de programação e meu autêntico tutor nos primeiros tempos. e ao ricardo reis, presidente da rádio e ouvinte atento e interessado do programa. muito obrigado, também, aos outros todos, cujos nomes seria talvez fastidioso aqui enumerar. eles e elas sabem quem são.

outra palavra, muito importante, para o ricardo mariano (o 'senhor vidro azul', esse mesmo) que me serviu de inspiração pessoal - tal como o seu 'vidro azul' me serviu de mote para a criação da arquitectura conceptual e afectiva da 'estação'.

uma palavra também para as pessoas que me acompanharam nos primeiros programas, mesmo que à distância, incentivando-me a continuar. por ser também justa, uma palavra para a mar, a lebre do arrozal, a ana s., a ana c., a conceição r., a sónia b., e para mais umas quantas pessoas que, semana após semana, enquanto o programa não levantava vôo, enquanto não entrava em velocidade cruzeiro, me deram, gentil e graciosamente, aquele suplemento de alma que sempre fez, faz e fará toda a diferença.

ao diogo vaz pinto, da revista criatura, ao manuel de freitas, da editora averno, e ao tiago nené, do texto-al, o meu muito obrigado pelo pontual mas certeiro sinal de que certas coisas valem a pena, de que a estrada faz-se para nela seguirmos viagem. com coragem e, desculpem a palavra tão gasta, com amor.

finalmente, e antes de me despedir de ti, ouvinte e leitor anónimo, uma breve referência de natureza diferente. aos meus fantasmas concretos, aos abutres abstractos, aos espectros nocturnos, aos ventos gelados dos meus longos invernos metafóricos: sem vós, não teria existido a 'estação de inverno' ou, pelo menos, esta 'estação de inverno'.. this one has been, therefore, also for you, demons of mine.

a ti, meu leitor, meu ouvinte, anónimo e amigo: que estejas hoje mais humano, ao fim destes 76 programas, são os meus mais sinceros votos. porque a beleza desprovida de uma ética é falsa. e porque toda a ética é bela.

para terminar, e porque temos na vida que ter especial cuidado com a forma como desferimos o remate final, tal como o john darnielle, dos mountain goats (e com sua generosa licença): dedico esta segunda época do programa à luz improvável pela qual espero e anseio todas as noites da minha vida.

sejam felizes.


joão blake

lisboa, julho de 2009.




[se acharem o texto com um tudo-nada melodramático, paciência. hoje estamos assim, amanhã não sabemos. nem sequer se vamos cá estar, não é?]

estação de inverno: 76ª estação (última edição da 2ª época)

amanhã, terça-feira, a septuagésima sexta estação de inverno.


esta semana, a última edição desta segunda época do programa. uma edição especial, com uma duração alargada - 2 horas -, para melhor nos despedirmos deste inverno 2008/2009 e darmos as boas-vindas às férias de verão.

musicalmente, duas dúzias de canções que, esperamos bem, sejam capazes de vos deixar entre um estado de prostração estética e um estado de exaltação ética. ou será exultação? ou será ao contrário? palavras, palavras, sempre as palavras.

as palavras, a título absolutamente excepcional, serão de joão blake. sim, que o timoneiro desta nau também escreve algumas coisinhas, naqueles breves intervalos em que não está entretido com a vida civil ou a brincar aos programas de rádio..

em suma: canções de inverno e a poesia (amadora) de joão blake. eu, aqui; os meus amigos e as minhas amigas, aí desse lado. o verão, no calendário; o inverno, sempre presente na geografia mais interior. e o final de mais uma etapa.

é a vida, como dizia um nosso antigo primeiro-ministro. é a vida.


[disponíveis todos os podcasts de emissões anteriores.. aqui!]

[rádio zero: terças: 23h-24h; repete sábados: 14h-15h]
[ruc: madrugadas de domingo para segunda: 3h-4h]

06 julho 2009




as minhas desculpas a todos. este 'homenzinho' é aqui interrompido, por imperiosa necessidade. seguirá dentro de momentos.

arthur shopenhauer

bertrand russell

irving singer



longe, pois, de adivinhar que a filosofia ainda viria a ser a minha melhor amiga.
[reparem, ali mesmo em baixo, como um homem impossivelmente belo enfrenta as trevas: com o cabelo bem penteado, não por vaidade mas porque a dignidade estética encerra sempre um princípio de dignidade ética; cabisbaixo, porque assim dói menos, perante a irreversibilidade do que se aproxima. reparem, ali mesmo em baixo, do lado direito do vosso écran, a cor escura avança em direcção a ele, como se de um tornado em 'slow motion' se tratasse, como se de uma tempestade tropicável formidável se tratasse. reparem, ali mesmo em baixo, como no auge da juventude, da fama, da beleza física, é já a perda anunciada que tudo domina. és pó, homem, lembra-te todos os dias disso, todas as horas, todos os minutos. renuncia.]

estação de inverno: 75ª estação




amanhã, terça-feira, a septuagésima quinta estação de inverno.


a dois passos do final da segunda época da 'estação de inverno', continuaremos (bem, mal?) acompanhados pela poesia dissolvente de rui pires cabral, concluindo a leitura partilhada da sua mais recente obra: 'oráculos de cabeceira' (edição da averno, já de 2009).

e porque estar perto do fim é sempre revelador do carácter último das coisas/pessoas (riscar o que interessa, perdão o que não interessa, perdão tudo, perdão nada), abrimos as portas do programa de par em par para aquele que ficou conhecido como 'o poeta do jazz': chet baker.

a partir de gravações de 1953 a 1956, iremos trazer até vós uma dúzia de canções (standards americanos, em bom rigor) cantados por chet baker. optámos por este lado de intérprete vocal, em detrimento do lado 'puramente jazzístico', por uma questão de gosto pessoal e também porque faz mais sentido assim, dentro da matriz original deste programa de rádio.

há dez anos atrás ouvíamos chet baker compulsivamente. desconfiamos bem que, havendo vida e saúde, daqui a outros dez continuaremos a escutar este senhor. impossivelmente romântico? doentiamente romântico? é bem possível. mas chega de qualificativos - a cada um his/her own private chet baker.

é assim a 'estação'. saudades já, saudades tantas.


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05 julho 2009

joão em concerto. joão em conserto. joão sem conserto.




um vício consentido.

e um vício com sentido.

04 julho 2009




the more you ignore me, the closer i get - you dolce vita.

03 julho 2009

tenho um homem dentro de mim fora do sítio, dizia o vasco gato, nesse livrinho terrível que é omertá (o pacto de silêncio da mafia siciliana).


acordar às 8.30 já dentro de uma reunião. misturar os planos corporativos, multinacionais, os scorecards, os progress reports com statements pessoais, levando a interlocutora, ao fim de breves segundos, a dizer: 'arrisco, joão, que precisa urgentemente de arejar.' e seguir, manhã dentro, para uma conversa levemente surreal, impressionista, com um travo existencial temperado com metafísica. carreira, vida pessoal, grandes decisões. um possível emprego a 40 quilómetros de são paulo, no brasil, gerindo 4000 pessoas. ouvir: 'você era rapaz para isso'. e sabermos, dentro de nós, que não, não somos rapaz para isso.

ter uma reunião com um director de um banco e uma gestora assistente do mesmo. demorar 60 minutos numa negociação árdua, interpretando o nosso lado mais hard, personificando a força que às vezes quase, quase temos dentro de nós.. para, numa curva súbita, enveredar por uma longa e minuciosa exposição sobre 'o nosso contexto'. e como o banco, um banco, pode ajudar nessa transição. e avançar, por ali fora, num relato pungente, terrívelmente eficaz, deixando os interlocutores de lágrima ao canto do olho (ela) e em silêncio, quase estupefacto (ele). atirar, a fechar, que esta poderia ter sido uma performance. e, antes de admitir que não, escutar, em uníssono, do outro lado: 'não se preocupe, sabemos que não foi'. fim de reunião. ao início, meio gingão, havia dito: 'estão a gravar esta conversa? podem fazê-lo com intuitos pedagógicos'. mal eles sabiam que falava a sério.

'já ofereceste alguma coisa a ti próprio, pelo teu aniversário?', perguntava a amiga, do outro lado da linha, a uma distância suficientemente segura de mim próprio. a segunda pessoa, em menos de 24 horas, a fazer-me essa pergunta. e eu responder algo como 'coisas materiais não me dizem nada' (ok, talvez um bom fato me diga alguma coisa..). 'eu não pensava nessas coisas', retorquiu. 'nem eu', respondi-lhe. fica prometido, depois conto-te. vou-me dar uma prenda. uma prenda que quero agora, aqui e agora, porque sim (essa tal razão que tantos dissabores, delírios, frémitos, espantos me causou na vida que levo). e assim foi, exposição e intensidade. um grão de loucura, guerra aos medos e ao sentido, por um momento lutar contra a biografia, e os fantasmas, e os medos, e o socialmente correcto protocolo humano e enfim começar a viver um bocadinho mais. menos complexadamente. menos perfeitamente. menos para a bancada e mais para mim próprio.

e a conversa improvável, talvez ridícula, talvez embaraçosa, talvez apenas humana - melhor: furiosamente imperfeita e dilacerantemente humana - que se seguiu. sobre esta, palavra de escuteiro que nunca fui, nem uma palavra escrita. mas lá que ficou qualquer coisa escrita cá dentro, lá isso ficou.

a arte da intensidade. e este aroma a fim de festa. e uma janela enorme rasgando-se à minha frente e dizendo: 'não tenhas medo, joão'.

há dias assim. e há rapazes-já-pouco-rapazes assim, à procura do joão-sem-medo que será, talvez, a derradeira porta rumo à alegria.

02 julho 2009

ontem, atingi a módica idade de 37 anos. tantos sonhos por cumprir. é tudo o que (não) tenho a dizer.



ontem fiz 37 anos. eu não acredito, mas o BI, esse impiedoso burocrata em forma de rectângulo, torna estas coisas incontornáveis.


aos mais de 50 amigos, familiares, colegas, etc. que me ligaram: o meu muito obrigado. na hora precisa, estiveram cá. esta só eu entendo plenamente - e ainda bem que é assim.


a quem me não ligou, por esquecimento: não faz mal. isso acontece-me muito e sei que não é (mesmo) por mal. era o que faltava, medir a intensidade de certos fios afectivos pela espessura visível da corda..


a quem me não ligou, fruto de uma escolha ponderada: parabéns pela coragem. é uma forma de verticalidade rara. dizer não. e ser mesmo não.


a quem me não ligou, fruto de uma estratégia negra: os gestos ficam com os seus autores, não com eventuais "objectos" desses mesmos gestos.


a quem se deixou levar pela espuma dos dias, um aviso: cuidai de vós.
'lá atrás, a paisagem em destroços.
olha a grande novidade.'


rui pires cabral (de memória).